terça-feira, setembro 27, 2022

Resenha | O último homem, de Mary Shelley

 "O último homem", de Mary Shelley não deve ser lido como "Frankenstein", é uma obra completamente diferente. Embora título e sinopse indiquem uma distopia, é um livro clássico, um romance de costumes, antes de qualquer rótulo.



Sinto falta de dois pontos para chamar “O último homem” de distopia 


1- A causa (doença) ter uma linha alternativa. Quem tomou a decisão que levou a humanidade para aquele caminho distópico? Porque é uma doença e a deterioração é natural pela falta de conhecimento da época, como foi com a peste. O desenvolvimento da estória se dá como em qualquer outro romance realista da época.

 

2- O outro ponto é a falta de crítica social que normalmente acompanha essa decisão que leva a sociedade ou o mundo para o caminho errado. Talvez se ela usasse a guerra como o problema que alastrou a doença e/ou que impediu uma busca pela cura, ficaria mais próximo do gênero distopia como o conhecemos hoje.


Então “não é uma distopia”, mas pode ser considerado um rascunho de um novo gênero, já que ela olha para o futuro e não o imagina como uma utopia, como acontece em “O mundo resplandecente” de Margaret Cavendish.


Se defendo logo de início que não se tratada de um distopia é somente para afastar aqueles leitores que por ventura imaginem que a estória tem qualquer relação com as distopias contemporâneas.





Minhas impressões sobre “O último homem”


O texto classudo de Mary Shelley foi muito bem traduzido por Jana Bianchi, apesar disso, por se passar num futuro distante, 2097, porém observado/criado a partir de um passado tão distante de nós, gera uma dificuldade de conexão com a história. Acredito que por isso a uma resenha que li tenha o título de "pior livro". Não é.


Trata-se de um livro de texto antigo que precisa ser situado no seu tempo. A partir do momento em que se observa esse detalhe tudo fica mais fácil. 


Acompanhamos a história de vida de Lionel Verney, que teve a sua infância, e a de sua irmã, prejudicada com a morte do pai. Este tinha um vínculo com o rei que abandonou a família à sua própria sorte. Os irmãos acabam órfãos e Verney desenvolve um ódio à família real. 


Esse é o ponto de partida e muita água passa por debaixo dessa ponte até o final do romance, que prega algumas ideias sobre o amor, a amizade e o sentido da vida. 





É um texto gostoso de ler. O protagonista conta a sua história de vida, dos seus familiares e amigos. Tem os dramas da época com romances românticos, costumes da vida aristocrata, decadência política, fim da monarquia, valores e etc. Tem momentos mais monótonos como todo romance longo e antigo, mas os bons momentos prevalecem.


Indicado para quem gosta de ler e não para quem só quer saber o fim da história, como todo bom romance clássico.



=P


quinta-feira, setembro 22, 2022

Resenha | Salmo para um robô peregrino, de Becky Chambers

 Escrever uma resenha de “Salmo para um robô peregrino”, de Becky Chambers, é uma missão complicada. Pra resumir em uma frase: Perfeito como tudo que Becky Chambers escreve!


É uma novela rápida de ler, mas de uma profundidade sem igual. A dificuldade em falar sobre a leitura é justamente essa. Sempre que leio a Becky termino emocionada, pensativa, e não sei como traduzir o que senti em palavras para que outras pessoas entendam. Meus comentários costumam ser “leia!”. Aqui vou tentar fazer um pouco melhor do que isso!


Resenha de “Salmo para um robô peregrino”, de Becky Chambers

Conforme mergulhamos na história vamos conhecendo  a vida dos personagens centrais, o humano Irme Dex e robô, Chapéu de Musgo. Aprendemos com eles sobre suas vidas, universos, temores e anseios. Parece tão simples, mas é carregado de detalhes e sutilezas que vão nos tocando e nos fazendo compreender a beleza daquela simplicidade.

Isso acontece, por exemplo, com a profissão que Irme Dex resolve seguir para mudar de vida. É um detalhe na estória, na verdade o que a coloca em movimento. Mesmo assim é linda e cativante. Outro ponto bonitinho é a história dos nomes dos robôs, que diz tanto sobre aquela forma de existir. Como todo texto de Becky Chambers, nada ali está por acaso. Cada palavra, cada frase, ação ou pensamento, vão se somando poeticamente e nos fornecem uma experiência incrível.


Becky escreveu a sua história de robôs!

Descobrimos com essa leitura que não somos tão diferentes assim dos nossos "amigos de lata", ou melhor, que eles não são tão diferentes de nós, humanos. E eles estão numa posição intelectual muito interessante. Chapéu de Musgo é aquele tipo de personagem que sabe fazer as perguntas certas.

Becky coloca a sua história de robô no hall das melhores de ficção científica, é impossível não lembrar de Asimov. Seus robôs são perfeitos, apesar de terem sido criados por nós (seres tão imperfeitos), encontraram o equilíbrio. Mesmo tendo sido dispensados e afastados de nós, por não serem humanos, não guardam rancor. Pelo contrário, querem saber como podem nos ajudar. 

Mesmo a visão sobre a humanidade traz um pouco de esperança. Não somos mais os vilões imbecis, embora ainda não estejamos à altura dos robôs. Sem arrogância, é uma constatação. De forma muito sensível, estilo da autora, reconhecemos nossas falhas como seres humanos e enxergamos como poderíamos ser melhores. 




Vai ter linguagem neutra SIM!

Uma característica importante desse livro é a tradução de Fábio Fernandes, apoiada pela Morro Branco (obrigada!), na qual ele procura ser o mais fiel possível a linguagem neutra, escolhida pela autora. Se você estiver atento a essa resenha, viu ali um “Irme Dex”, que é a versão neutra de “irmão”. 

Sempre que a autora se refere a esse personagem, usa linguagem neutra, que é bem mais fácil no inglês. Então o desafio do tradutor foi grande, mas ele fez tudo direitinho. Quando li que seria assim, me preparei para uma linguagem difícil, não é. Achei muito fluído e natural, me fez inclusive mudar a impressão de que essa inserção na língua portuguesa seria complicada. Difícil mesmo é vencer o preconceito, a língua não será uma barreira. Ponto!


A escrita de Becky Chambers

Para quem nunca leu Becky Chambers, ou não teve muito sucesso na primeira tentativa, fica aqui uma dica: tente se conectar com a história que ela nos conta. É um tipo de escrita acolhedora, porém contemplativa, que exige o nosso comprometimento. Um esforço mínimo de abrir a mente e o coração, em troca de uma experiência fantástica. Acho que vale muito a pena!

Ela sempre fala de tudo que é importante para a sua história, então, se ficar achando que alguma coisa foi “jogada” ou “mal explicada”, vale a pena reler esses trechos e tentar entender qual a mensagem que ela quis nos passar.

Clique aqui para ler a mini bio da autora!


Caso não tenha ficado clara a minha opinião: leia “Salmo para um robô peregrino”, de Becky Chambers. E vale dizer que ele é o primeiro de uma série. A certeza de que ainda vem muita coisa boa pela frente.

Aproveito para agradecer à Morro Branco, esse livro me foi enviado pela nossa parceria (de milhões!). Que venham mais Becky, mais ficção científica!


Assista ao reels que publiquei no Instagram!




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