quinta-feira, março 17, 2022

Resenha | Bint, por Knedi Okorafor

Vou abrir essa resenha com a questão central: O livro, a edição brasileira, "Binti", de Knedi Okorafor,  tem problemas. 

Vou aqui elencar em tópicos os problemas que encontrei nessa leitura (sim, pensando no todo) e com essa edição. E, principalmente, tentando separar o meu "desgosto" com a história e o que problematizei sobre tudo, contexto, cenário e edição.




"Binti" foi premiado com Hugo e Nebula 

Então, minha primeira crítica vai para a editora. Porque esse livro tem uma tradução ruim, ele tem problemas de revisão, erros de digitação e concordância. O que é inaceitável para uma editora do porte da Galera Record, que teria condições (na minha visão "obrigação") de cuidar melhor de um produto como esse.

No post do Instagram eu disse que o livro estava mal escrito. Revi esse ponto agora, ao adaptar essa resenha para o blog, porque aqui eu tenho condições de elaborar melhor essa ideia. Estar "mal escrito", no caso de uma tradução, envolve vários quesitos. E, acredito que um livro que recebe prêmios importantes de literatura, têm algum valor literário. É o mínimo que se espera.

Acredito que o texto tenha sido mal traduzido, sem considerar algumas questões culturais da língua original em que foi escrito, ao passar para o nosso idioma. Por exemplo, quando a autora descreve uma situação dramática, em que a personagem foi derrotada, está desiludida, mas percebe a ironia daquele episódio da sua vida e completa o seu relato dizendo simplesmente "Ri". Eu estou interpretando e querendo acreditar que ela "sorriu", porque o "riso" normalmente está associado ao deboche. O que não caberia naquilo que acabei de ler.

E esse "Ri" aparece diversas vezes. A história tem muito drama e a personagem "ri" de tudo. Aquilo não faz sentido. Por mais que a gente entenda o problema de tradução literal (ou seja lá que jargão técnico se dá pra isso), quebra a fluidez e no meu caso, faz perder completamente o interesse pela leitura.


Não é ficção científica (e porque eu me importo?) 

Estamos cada vez mais nos deparando com classificações de gênero erradas. Entendo que às vezes é difícil de encaixar um Weird que inclui pinceladas de sci-fi (Como "É assim que se perde a guerra do tempo") ou quando a história mistura elementos de ficção científica com fantasia. Mas Binti, além de descrever um universo fantástico, tem pseudociência, o que considero ainda mais problemático "hoje em dia". 

Para entender o que penso que seja Ficção científica, leia: O que define uma obra como de Ficção Científica?

  1. Pensa comigo, se a ideia é ser ficção científica, não faz sentido explicar a origem do que chamam de ciência como algo que veio de deidades, e não do estudo científico. Certo? Assim como não faz sentido falar que é sci-fi um dom que não se ensina, não se passa adiante, nem se evolui, só repete o que recebeu divinamente.
  2. A outra parte do que poderia ser considerado "tecnológico" passível de qualificá-lo como elemento sci-fi, foi um salto tecnológico dado de "presente", de alienígenas, para uma tribo. E os seres humanos, de posse desses artefatos, não foram estudá-los para entender como funcionavam, como melhorá-los ou reproduzi-los. Eles passam gerações usufruindo desse recurso, sem compartilhá-lo ou desenvolvê-lo. Nem mesmo uma engenharia reversa para entender melhor, caso aquilo parasse de funcionar.
  3. A viagem espacial é um elemento sci-fi, vocês podem argumentar. Mas e se a viagem para o espaço é feita com um bicho que apareceu aqui na Terra e convidou os humanos pra um passeio? 👀 Não foi a humanidade, nem qualquer outra civilização, que desenvolveu a tecnologia necessária...
  4. E não para por aí. Existe uma "universidade universal", no espaço. Mas, ela serve pra desenvolver habilidades que os alunos normalmente trazem consigo, não pra difundir conhecimento ou estudar para fazer novas descobertas. Qualquer semelhança com a escola de bruxos mais famosa do mundo, ou a escola do Xavier, não deve ser mera coincidência.
  5. Então, retomando aqui a questão dos elementos que qualificam uma obra como de ficção científica, entendam que: se a origem da tecnologia ou mesmo da viagem espacial e contato extraterrestre não tem explicação científica: é fantasia. Se existe um poder sobrenatural... Fantasia, weird, realismo fantástico, ficção especulativa - não tem porque chamar de ficção científica.


Engana-se quem pensa que a fantasia se ocupa de descrever universos desprovidos de tecnologia. Os personagens podem voar pelos mundos, fazer uso de naves espaciais, encontrar extraterrestres, robos, se envolver em guerras e ainda será fantasia, caso não explique a origem científica disso. Ex: Star Wars.

É um problema Bint não ser Sci-fi? Claro que não. Estou apenas sendo chata e pontuando algo que ME incomoda, porque não sou fã de fantasia.


Qual é a proposta de Binti? (a problematização)

A ideia desse livro era discutir os povos africanos? Posicioná-los na literatura com os "futurismos" que pedem a contemporaneidade? 

Bem, uma fração disso é apresentada quando a personagem mostra o seu preconceito em relação a uma tribo vizinha. Três tribos vivem muito próximas e se odeiam e procuram ignorar a existência uma da outra ao longo de gerações. Ok, isso é bem humano. 

Mas, no que contribui para a inclusão de povos africanos, os três povos serem preconceituosos e intolerantes uns com os outros, parados no tempo. Não entendi? Li errado? Provavelmente.

Fazendo um link desse tópico com o anterior e juntando com a minha opinião/visão dessa história. Acho problemático colocar tecnologia alienígena ou divina nas mãos de um povo como único recurso para o avanço tecnológico. Acho problemático que a história priorize o acesso ao conhecimento e desenvolvimento de povos como "presentes" e não como pesquisa, estudo e esforço em busca daquilo. 

Eles não têm capacidade? Passamos dos anos 2000, a computação, medicina, viagens espaciais, wi-fi são uma realidade, fruto de pesquisa e estudo. Porque o afrofuturismo não coloca isso como parte da sua história? Eu não entendo.


Opinião pessoal, minha mesmo

No mais é um YA (jovem adulto), para mim, raso, cansativo e redundante. A menina chora por tudo e por nada. Ela sequer desenvolve os sentimentos que a levam aquele sentimento, só diz que chora, chora e chora... 🙄 A personagem fala do aparelho que achou no deserto e do negócio que passa pelo corpo e o quanto aquilo é importante pra identidade cultural dela. Mas, assim, sem elaborar, só repetindo mesmo. 🤦🏻‍♀️

O livro é narrado em primeira pessoa, poderia nos dizer o que estava "pensando ou sentindo" e não o que estava "fazendo".


Enfim... É essa a minha opinião sobre esse livro, do qual esperei tanto e me decepcionou pacas.


Fim. 

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